A relação entre a produção de força e a flexibilidade pode ser analisada a dois níveis: 1) da capacidade de produção de força em diferentes amplitudes articulares; e 2) da relação entre o nível de flexibilidade e a capacidade de produzir força. Face ao primeiro ponto, tem sido evidenciado que sujeitos com maiores níveis de flexibilidade apresentam picos de força isocinética em amplitudes articulares superiores, e consequentemente uma maior capacidade de produção de força em amplitudes articulares elevadas (Alonso et al., 2009). Especula-se que este facto se deve a um maior comprimento dos fascículos musculares em sujeitos com maiores níveis de flexibilidade. Para além da diferente capacidade de expressar a força em função do grau articular entre sujeitos com diferentes níveis de flexibilidade, parece, no entanto, que o treino de flexibilidade permite deslocar a curva força-comprimento (i.e., curva isocinética) para a direita ( McHugh & Nesse, 2008). Ou seja, práticas de alongamento que visem o aumento agudo da amplitude do movimento tendem a aumentar a capacidade de produção de força em amplitudes articulares superiores, embora vejam diminuído o pico de força isocinético. O mesmo efeito parece acontecer a nível crónico, mas sem alterar o pico de força máximo (Abdel-Aziem & Mohammad, 2012).
Face ao segundo nível de análise da relação da expressão da força e flexibilidade, o efeito que o nível da flexibilidade representa na capacidade de produzir força, a investigação recente demonstra que sujeitos com maior resistência ao alongamento (i.e., rigidez passiva articular) apresentam uma maior capacidade de força máxima e de taxa de produção de força (Ryan et al., 2009). Sobre a premissa de que os sujeitos mais flexíveis tendem a apresentar menor resistência ao alongamento, é possível que uma maior flexibilidade seja contraproducente para a manifestação da força quando acompanhada de uma diminuição de rigidez articular, que é consequente de uma menor rigidez dos tecidos que atravessam a articulação. No entanto, este facto tende a ser explicado pelo facto de os sujeitos com maior resistência ao alongamento apresentarem, habitualmente, uma maior secção transversa muscular, o que concorre para uma maior rigidez passiva articular (Neto et al., 2013; Ryan et al., 2009). Isto permite concluir que não é o nível de flexibilidade que explica directamente diferenças na capacidade de produção de força entre sujeitos, mas sim a rigidez passiva articular.
Em resumo, os níveis de flexibilidade influenciam a capacidade de produzir força ao longo da amplitude articular, e esta condição parece ser afectada pelo treino da flexibilidade. Este aspecto tem relevância em práticas desportivas que exijam a produção de força em amplitudes articulares elevadas (ginástica). Mais, o nível de flexibilidade dos indivíduos não parece afectar a capacidade de produção de força quando a variação da flexibilidade nao se faz acompanhar por uma diferente dimensão da secção transversa muscular dos músculos que atravessam a articulação, o que, por sua vez, altera a rigidez passiva articular.
Bibliografia:
Treino da Força, Volume 2, Avaliação, Planeamento e Aplicações. Correia, Mil Homens e Mendonça, FMH, ULisboa
Alonso, J., Mchughm M. P., Mullaney, M. J., & Tyler, T. F. (2009). Effect of hamstring flexibilty on isometric knee flexion angle-torque relationship. Scandinavian Journal of Medicine & Science in Sports, 19 (2), 252-256
McHugh, M., & Nesse, M. (2008). Effect of stretching on strength loss and pain after eccentric exercise. Medicine & Science in Sports & Exercise, 40 (3), 566-573
Abdel-Aziem, A., & Mohammad, W. (2012). Plantar-flexor static stretch training effect on eccentric and concentric peak torque – A comparative study of trained versus untrained subjects. Journal of Human Kinetics, 34, 49-58.
Ryan, E. D., Herda, T. J., Costa, P. B., Defreitas, J. M., Beck, T. W., Stout, J. R., & Cramer, J.T. (2009). Passive properties of the muscle-tendon unit: the influence of muscle cross-sectional are. Muscle & Nerve, 39 (2), 227-229.
Neto, T., Freitas, S., Vaz, J., Silva, A., Mil-Homens, P., & Carita, A. (2013). Lower limb body composition is associated to knee passive extension torque-angle response. Springer Plus Journal, 27 (2), 403.

Este é o segundo dos 7 artigos que resumiremos sobre o treino de força e flexibilidade. Nenhum dos artigos é da nossa autoria. Todos os autores estão citados na bibliografia acima mencionado. O objectivo deste espaço é informar os nossos atletas e curiosos sobre os mais diversos temas.